É muito comum, e muito forte na cultura brasileira, se falar do caráter de um povo.
Desde os fins do século XIX, a sociologia brasileira tenta dar conta de descrever o que é o brasileiro.
Alguns povos se colocam mais esta questão do que outros.
Uma espécie de autoconsciência coletiva.
Podemos dizer dos franceses, cujo patrimônio histórico comum é tão vasto, que acabam
pensando que a nação é uma verdadeira comunidade e um destino.
Aos americanos, cabe sempre uma interrogação.
E por que?
Primeiramente, porque ali estão, devido a um sonho, ainda que herdado (do avô, do bisavô).
O sonho de uma vida em outro lugar, onde é possível, talvez, comer, praticar a religião, etc, sem ser perseguido.
É um sonho de um futuro.
O europeu não tem esta questão.
O sujeito é francês, simplesmente porque nasceu na França, não havendo neste processo, uma escolha, um desejo.
Eis aí, uma grande diferença subjetiva, já que nas Américas, o sujeito é muito mais interrogado por seu futuro do que pelo seu passado.
Podemos pensar aí, o significado da palavra LOOSER, que soa tão forte na maneira de pensar do americano. Quer dizer que, ele está ali por causa de um sonho, dele, ou herdado, tanto faz. É preciso dar conta desta “dívida” com o futuro.
O europeu vive muito mais em função de uma “dívida” que ele tem com o passado. Ele está mais preocupado com o que o passado exige dele.
Que dívidas são estas do europeu?
A França e mais geralmente a Europa são o resultado de um longo passado que viu a miséria, as guerras e as revoluções sociais suceder-se durante os séculos.Durante este período rico uma herança intelectual, arquitetural e patrimonial é constituído.Inconscientemente, no colectivo europeu, uma obrigação de preservação dos acervos tomou lentamente um lugar preponderante.O europeu é consciente que o degrau forçado para a globalização é irreversível.Sabe que o seu futuro, a sua vida, ou mesmo a sua sobrevivência passa pela união das nações européias que como todos sabem faz a força.Mas é convencido que esta união deve fazer-se economica mas também, socialmente.Qualquer ideia de evolução dos valores por um nivelamento dos acervos pela parte inferior lhe é insuportável.O europeu sente-se "investido" de um dever de memória no que diz respeito à sua história.A cultura é a herança fundamental do seu pensamento.Qualquer coisa que poderia retirar-lhe a sua "especificidade" é vivida por ele como um drama.Não quer ser um simples número sobre o livro de conta da humanidade...
E o que seria um caráter brasileiro?
Sou brasileiro porque gosto do samba e do futebol?
O perigo deste tipo de definição está na implicação de que: “Somos brasileiros, malandros, todos à venda, e gostamos do famoso jeitinho”.
Ou então, “Não gostamos do conflito”, o que oblitera nossa história subjetiva e coletiva por meio de uma visão muito fácil de nós mesmos.
A frase: “O Brasil não é para principiantes”, supõe que a nossa malandragem nos torna especiais e só interpretáveis por especialistas. Pelo contrário, o Brasil é para amadores e principiantes, porque pagar e corromper é muito fácil.
O difícil é ser moral, construir uma coletividade em que haja leis, institucionalidade.
Ser imoral é que é para principiantes.
A malandragem é uma conduta moral para crianças de 9 anos.
O difícil é crescer. Governar pagando o cara para votar comigo é que é amador.
O Brasil, por não ter conquistado a independência na ponta da faca, manteve uma espécie de complexo de inferioridade permanente em relação às metrópoles culturais.
Nossas heranças culturais são menosprezadas e deixadas de lado perante o que o restante do mundo nos oferece, agora muito mais com o processo de globalização.
Não há um consenso (salvo raras exceções) sobre o que representa a história do nosso passado, não apenas no que concerne às artes, como também do movimento político, social e econômico até os dias de hoje.
Vivemos um momento crítico em relação aos valores morais.
Fica difícil dizer de uma identidade, quando nossos objetivos se direcionam aos Estados Unidos, ou à Europa, em busca de ajuda ou de modelos que bem nos atendam num conceito de nossa própria história.
Fica difícil dizer de uma identidade, quando nossos objetivos se direcionam aos Estados Unidos, ou à Europa, em busca de ajuda ou de modelos que bem nos atendam num conceito de nossa própria história.
Sem uma herança a ser guardada, resta-nos a construção de um sonho.Um sonho que comece a desenhar um carater específico de brasileiro.
Qual seria ele?
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